No meio da parafernália de pequenas, médias e grandes notícias sobre quase tudo e quase nada, foi com alegria que recebi a notícia da canonização de D. Nuno Álvares Pereira, o Santo Condestável. Como católico e como português. E também pelo facto de a este processo de canonização estar associado o Cardeal português D. Saraiva Martins, de quem, há cerca de três anos, tive a honra de apresentar o livro “Como se faz um Santo”.
É claro que esta simbólica distinção que muito honra a portugalidade no Mundo – mesmo que analisada apenas fora do contexto religioso – não faz manchetes, como fazem à profusão as distinções de um bom jogador de futebol, de um consagrado autor, de um artista de telenovela ou de um empresário de sucesso fulminante.
O que anima certos meios de opinião liofilizada e quase sempre desconhecedores da religião é a discussão (?) sobre a natureza do milagre que está associado à canonização do Beato Nuno. Mas o povo, na sua sabedoria genuína e despoluída, já há muito o havia consagrado como o Santo Condestável. Isso mesmo: santo carmelita e condestável chefe militar e primeiro dignitário do Reino!
Agora que os Santos parecem estar “fora de moda” numa sociedade de “zapping”, comportamentalmente hedonista, moralmente relativista e subjugada à “ditadura das banalidades”, o que vem à liça é minimizar a espiritualidade e a transcendência associadas à santidade. Daí que, nesta onda em que é quase compulsivo em certos meios pôr em causa tudo o que emerge no seio da Igreja, o Santo Condestável seja depreciado por alguns como um “contestável santo”…
O que é certo é que D. Nuno Álvares Pereira, cuja vida de verdadeiro patriota não é de todo contestável e nos habituámos a respeitar, é um exemplo num tempo em que o valor da exemplaridade escasseia. Não apenas na sua vida mais religiosa quando após a morte da sua mulher e despojado de todas as propriedades, títulos e honrarias, se tornou carmelita e viveu um tempo totalmente dedicado aos mais pobres entre os pobres, mas igualmente como notável general de uma guerra que nos garantiu a independência seriamente ameaçada.
Ser santo - como o demonstra a vida de Nuno Álvares Pereira - sempre representou uma forma de subversão, traduzida em cada época de modo diverso e como regra vivida na ausência de qualquer forma de poder, que é onde se revela toda a força da presença de Deus.
Na sociedade contemporânea em que, no plano da relação com Deus, clamamos muito mas obedecemos pouco, o Santo é uma espécie de novo insurrecto sinalizador e modelo da pureza, da harmonia, da espiritualidade levada à sua mais bela singeleza.
No fundo, somos reconduzidos à mais forte constatação: a de que para se ser santo é necessário praticar e, acima de tudo, concretizar o Evangelho. Assim se atinge a perfeição da caridade entendida como a mais elevada medida de amor para com o Criador e para com o próximo. São Paulo haveria de sintetizá-la numa curtíssima expressão: não vivo mais eu, mas Cristo vive em mim.
A santidade de Nuno Álvares Pereira simboliza a purificação da heroicidade do simples e é a expressão vitoriosa do homem de e para todos os tempos sobre o homem do instante.
A santidade sempre foi entendida como a expressão da Graça Divina, mas também da condição livre de se ser pessoa. O Santo Condestável representa, na História de Portugal e do Mundo, este traço de união entre o passado e o futuro, entre a memória e o exemplo, entre a vida pública e a consagração a Deus.
O Beato Nuno de Santa Maria é um exemplo de uma vida ao serviço do outro, alicerçada numa fé inabalável e num espírito de radical caridade. Através dele poderemos entender melhor o caminho da santidade pelo qual a caridade é, ao mesmo tempo, o coração da inteligência e a inteligência do coração, e que só a partir do nosso interior se pode transformar o que nos é exterior.
Se há quem congregue sem ensinar e quem ensine sem congregar, o novo santo português ensinou pela universalidade do seu exemplo e congregou na perfeição das suas virtudes. Parafraseando S.S. o Papa Bento XVI, D. Nuno viveu profundamente consciente que “se Deus não está presente tudo se torna completamente insuficiente”.
Neste momento em que escrevo, não posso deixar de registar, no plano institucional e político, uma atitude e uma omissão.
A atitude de o Senhor Presidente da República, como o mais alto magistrado da Nação, se ter congratulado, em nome de Portugal, e considerado D. Nuno “uma figura maior da nossa história que, no passado e no presente, deve inspirar os portugueses na busca de um futuro melhor”.
A omissão e o silêncio do lado do Governo e de alguns partidos políticos, sempre tão pródigos e rápidos em felicitar outras personagens nem sempre significantes e em formular votos de congratulação por dá cá aquela palha.
É recorrente nestas alturas usar-se e abusar-se do argumento da separação compulsiva entre o Estado e a Igreja. A louvável e imperativa neutralidade religiosa do Estado não pode, porém, transformar este num Estado anti-religião.
A laicidade do Estado não implica a laicidade da sociedade. A sociedade é plural no sentido religioso e é perigoso confundir sistematicamente, neste plano, Estado e Sociedade. A separação do Estado e da Igreja também não significa neutralidade por omissão, indiferença, abstenção, ignorância ou desconhecimento dos fenómenos religiosos e muito menos hostilidade.
Mas no caso de D. Nuno Álvares Pereira não se exige do Estado que o homenageie como santo católico. Apenas, que o sinalize para as gerações vindouras como grande, ilustre e exemplar português. A História faz parte do presente e do futuro, embora, como um dia escreveu Miguel Torga, “os nossos governantes não querem saber da História. Para eles tudo começa na hora em que assumem o poder”
Em suma: o Beato Nuno é agora consagrado universalmente como o São Nuno de Santa Maria. O povo vê assim confirmado pelo Papa o nome de um incontestável Santo Condestável!
É claro que esta simbólica distinção que muito honra a portugalidade no Mundo – mesmo que analisada apenas fora do contexto religioso – não faz manchetes, como fazem à profusão as distinções de um bom jogador de futebol, de um consagrado autor, de um artista de telenovela ou de um empresário de sucesso fulminante.
O que anima certos meios de opinião liofilizada e quase sempre desconhecedores da religião é a discussão (?) sobre a natureza do milagre que está associado à canonização do Beato Nuno. Mas o povo, na sua sabedoria genuína e despoluída, já há muito o havia consagrado como o Santo Condestável. Isso mesmo: santo carmelita e condestável chefe militar e primeiro dignitário do Reino!
Agora que os Santos parecem estar “fora de moda” numa sociedade de “zapping”, comportamentalmente hedonista, moralmente relativista e subjugada à “ditadura das banalidades”, o que vem à liça é minimizar a espiritualidade e a transcendência associadas à santidade. Daí que, nesta onda em que é quase compulsivo em certos meios pôr em causa tudo o que emerge no seio da Igreja, o Santo Condestável seja depreciado por alguns como um “contestável santo”…
O que é certo é que D. Nuno Álvares Pereira, cuja vida de verdadeiro patriota não é de todo contestável e nos habituámos a respeitar, é um exemplo num tempo em que o valor da exemplaridade escasseia. Não apenas na sua vida mais religiosa quando após a morte da sua mulher e despojado de todas as propriedades, títulos e honrarias, se tornou carmelita e viveu um tempo totalmente dedicado aos mais pobres entre os pobres, mas igualmente como notável general de uma guerra que nos garantiu a independência seriamente ameaçada.
Ser santo - como o demonstra a vida de Nuno Álvares Pereira - sempre representou uma forma de subversão, traduzida em cada época de modo diverso e como regra vivida na ausência de qualquer forma de poder, que é onde se revela toda a força da presença de Deus.
Na sociedade contemporânea em que, no plano da relação com Deus, clamamos muito mas obedecemos pouco, o Santo é uma espécie de novo insurrecto sinalizador e modelo da pureza, da harmonia, da espiritualidade levada à sua mais bela singeleza.
No fundo, somos reconduzidos à mais forte constatação: a de que para se ser santo é necessário praticar e, acima de tudo, concretizar o Evangelho. Assim se atinge a perfeição da caridade entendida como a mais elevada medida de amor para com o Criador e para com o próximo. São Paulo haveria de sintetizá-la numa curtíssima expressão: não vivo mais eu, mas Cristo vive em mim.
A santidade de Nuno Álvares Pereira simboliza a purificação da heroicidade do simples e é a expressão vitoriosa do homem de e para todos os tempos sobre o homem do instante.
A santidade sempre foi entendida como a expressão da Graça Divina, mas também da condição livre de se ser pessoa. O Santo Condestável representa, na História de Portugal e do Mundo, este traço de união entre o passado e o futuro, entre a memória e o exemplo, entre a vida pública e a consagração a Deus.
O Beato Nuno de Santa Maria é um exemplo de uma vida ao serviço do outro, alicerçada numa fé inabalável e num espírito de radical caridade. Através dele poderemos entender melhor o caminho da santidade pelo qual a caridade é, ao mesmo tempo, o coração da inteligência e a inteligência do coração, e que só a partir do nosso interior se pode transformar o que nos é exterior.
Se há quem congregue sem ensinar e quem ensine sem congregar, o novo santo português ensinou pela universalidade do seu exemplo e congregou na perfeição das suas virtudes. Parafraseando S.S. o Papa Bento XVI, D. Nuno viveu profundamente consciente que “se Deus não está presente tudo se torna completamente insuficiente”.
Neste momento em que escrevo, não posso deixar de registar, no plano institucional e político, uma atitude e uma omissão.
A atitude de o Senhor Presidente da República, como o mais alto magistrado da Nação, se ter congratulado, em nome de Portugal, e considerado D. Nuno “uma figura maior da nossa história que, no passado e no presente, deve inspirar os portugueses na busca de um futuro melhor”.
A omissão e o silêncio do lado do Governo e de alguns partidos políticos, sempre tão pródigos e rápidos em felicitar outras personagens nem sempre significantes e em formular votos de congratulação por dá cá aquela palha.
É recorrente nestas alturas usar-se e abusar-se do argumento da separação compulsiva entre o Estado e a Igreja. A louvável e imperativa neutralidade religiosa do Estado não pode, porém, transformar este num Estado anti-religião.
A laicidade do Estado não implica a laicidade da sociedade. A sociedade é plural no sentido religioso e é perigoso confundir sistematicamente, neste plano, Estado e Sociedade. A separação do Estado e da Igreja também não significa neutralidade por omissão, indiferença, abstenção, ignorância ou desconhecimento dos fenómenos religiosos e muito menos hostilidade.
Mas no caso de D. Nuno Álvares Pereira não se exige do Estado que o homenageie como santo católico. Apenas, que o sinalize para as gerações vindouras como grande, ilustre e exemplar português. A História faz parte do presente e do futuro, embora, como um dia escreveu Miguel Torga, “os nossos governantes não querem saber da História. Para eles tudo começa na hora em que assumem o poder”
Em suma: o Beato Nuno é agora consagrado universalmente como o São Nuno de Santa Maria. O povo vê assim confirmado pelo Papa o nome de um incontestável Santo Condestável!
António Bagão Félix
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